No dia 13 de maio de 1888, dia da assinatura da Lei áurea no Brasil, foi colocado um fim oficial a prática da escravatura – institucionalizada, extremamente rentável ao tráfico e de proporções gigantes no país – atualizando a postura política da nação perante o resto do mundo. Não, essa data não é comemorativa.
O ato da princesa Izabel não foi o primeiro de sua espécie e intuito, outras leis como, por exemplo, a Eusébio de Queiroz (fim do tráfico em 1850), Ventre Livre (que concedia a “propriedade” do filho escravo a mãe), Bill Aberdeen (lei de pressão inglesa sobre o tráfico) já vinham ao longo do século XIX tencionando a sociedade sobre o tema e a situação como um todo. Essas medidas não eram unanimidade de aceitação, pelo contrário, grande parte dos envolvidos ficavam descontentes com tais ações (leia-se os que lucravam), mas era inevitável o descompasso político-administrativo (coroa) e econômico com a permanência do costume.
A questão toma ainda mais profundidade perante a proporção de seu acontecimento em território tupiniquim. Durante todo o ocorrido, seus 300 anos, cerca de 40% dos que saíram da África rumo as Américas ficaram em portos brasileiros, tendo o “segundo colocado”, o Caribe, recebido menos da metade dessa porcentagem. O negócio das almas movimentou – em cálculo aproximado, pois não era uma viagem tranquila – cerca de 10 milhões de indivíduos que teriam que viver sob novos costumes, trabalho forçado e a liquidação de autonomia.
Tanto enraizamento, continuidade dessa prática não desaparecem de uma ora pra outra. O poder político na época (ainda não público) pouco o fez ou debateu sobre mecanismos de inserção desse contingente no meio social, agora, como iguais. Os anos de escravidão amorteceram grande parte dos costumes nativos, um processo de equalização com a vida instaurada na colônia (religião, música, relações pessoais) e, quando não aniquilados, recebiam carga pejorativa, profana, uma dicotomia de certo/errado muito polarizada para o lado europeu. Uma pesquisa feita pelo IBGE em 1988 – data do centenário – mostra que 97% dos entrevistados via constantemente, práticas de racismo, de descriminação em sua rotina e, desses entrevistados, 98% não eram “praticantes” de tais atos. Essa ilha de racismo (eu o vejo, a todo momento, mas não o faço) exemplifica o enraizamento social do ocorrido, além de mostrar a atualidade do tema, expondo a necessidade de uma ação, uma política, uma educação que encare de frente as problemáticas sociais.
Não, o 13 de Maio não é uma data comemorativa. O tempo percorrido desses 130 anos trouxeram debates, políticas públicas, avanços, retrocessos, sofrimento e felicidade a muitas pessoas no Brasil e no mundo. A assinatura do papel não extingui a questão, tampouco é um marco isolado da situação, mas remete a um debate muitas vezes negligenciado – famoso mimimi – e que não pode passar em branco.
Livros: Nem preto nem branco, muito pelo contrário – Lilia Moritz Schwarcz
Em costas negras – Manolo Florentino