No primeiro ensaio de seu livro Otras inquisiciones, Jorge Luis Borges observava, com espanto, que Che Huang-ti, idealizador da Grande Muralha da China, também mandou queimar todos os livros para apagar a memória de qualquer governo que o tenha antecedido. A coexistência do impulso realizador com a pulsão destruidora é analisada em minúcia pelo escritor (e bibliotecário) argentino. Tratar-se-ia de uma manifestação ambígua da criatividade, ou somente da necessidade de engrandecimento às custas da negação de feitos anteriores? Borges ousou imaginar as reflexões do imperador: “(…) um dia há de viver um homem que sinta como eu, e ele destruirá minha muralha, como eu destruí os livros, e ele apagará minha memória e será minha sombra e meu espelho, e não o saberá”.