Mais de 60% dos brasileiros tem acesso à internet e o Brasil é o 4º país mais conectado do mundo. Esse foi o ponto de partida do ministro substituto do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Carlos Horbach ao abrir o painel “Propaganda Eleitoral na internet: redes sociais e impulsionamento de conteúdo”, que deu seguimento ao seminário “Perspectivas e Desafios da Propaganda Eleitoral”, promovido pela Escola Judiciária Eleitoral do TSE (EJE/TSE) nos dias 19 e 20 de abril.
Segundo o ministro, o Direito é constantemente desafiado pela evolução dos tempos e dos costumes, especialmente o Direito Eleitoral na área da propaganda eleitoral, justamente pela evolução do uso da internet pela população. Ele apontou que as inovações trazidas pela reforma política de 2017 à legislação eleitoral, principalmente no campo da propaganda eleitoral na internet e nas redes sociais, foram refletidas na Resolução TSE nº 23.551/2018, dedicada à propaganda eleitoral.
Painel
Participaram do painel, pelo Facebook, a advogada Patrícia Helena Marta, a gerente de políticas públicas Rebeca Garcia, e a advogada Marilda de Paula Silveira.
Rebeca Garcia apontou que o Facebook é o jurisdicionado atípico mais frequente na Justiça Eleitoral, por causa da quantidade de usuários no Brasil e a crescente conectividade dos brasileiros. Já Patrícia Helena, por sua vez, citou que o Facebook já foi envolvido em cerca de cinco mil processos judiciais, dos quais apenas 17 foram trazidos aos tribunais superiores.
Ela explicou como funciona a dinâmica da plataforma e como se dá a aplicação dos termos e condições de uso da rede social, que é imposta a todos os usuários. Destacou ainda uma série de exigências que são feitas pelo sistema para garantir a credibilidade do conteúdo que circula na comunidade como, por exemplo, a exigência do nome civil, ou social, dos seus usuários. Marta também explicou que empresas, celebridades ou políticos não têm perfis, como os usuários pessoas físicas, mas páginas; que não têm amigos, mas seguidores. E, por fim, que essas páginas possuem ferramentas próprias, como a possibilidade de impulsionar (patrocinar) conteúdos ou criar eventos.
Para a advogada, a exigência incorporada pela legislação eleitoral para que o conteúdo denunciado seja identificado com a URL [endereço virtual] da postagem permite a sua exclusão de forma específica, preservando o resto da página que o gerou, salvaguardando assim a liberdade de expressão. Por fim, ela explicou a diferença de conceitos entre conteúdo orgânico e conteúdo impulsionado ou patrocinado, demonstrando as ferramentas disponibilizadas para que o usuário possa reconhecer os posts pagos e identificar quem é o responsável pelo seu impulsionamento.
Ao tomar a palavra, a advogada Marilda Silveira trouxe à discussão uma série de questões que, para ela, ainda precisam ser respondidas.
Ela destacou a dificuldade de fiscalização de conteúdos patrocinados, principalmente aqueles que são gerados por páginas não oficiais de apoiamento a candidatos, partidos ou coligações, ou por perfis falsos que seriam parte de uma guerrilha virtual. Também apontou o paradoxo da legislação eleitoral vigente, que proíbe a veiculação de propaganda tradicional nos dias que antecedem à votação, mas que permite que conteúdo patrocinado seja veiculado nas redes sociais até mesmo no dia da eleição.
Silveira questionou ainda os limites de legalidade na divulgação de conteúdo relacionado às eleições mas que não fazem parte da campanha eleitoral, como notícias sobre os candidatos, por meio de páginas que não fazem parte da campanha eleitoral oficial, ou por perfis falsos. Ao discorrer sobre esse tema, ela sugeriu que o controle desse conteúdo seja feito em três instâncias: identificação dos usuários, para exclusão de contas falsas; avaliação do conteúdo divulgado; e investigação sobre o impulsionamento desse conteúdo.
Encerramento
Os debates finais deste primeiro dia do seminário, intitulado “Fake news: democracia e controle judicial”, foi mediado pela representante da EJE/TSE, Fernanda de Carvalho Lage, e contou com a participação dos juristas Gustavo Bonini Guedes, Mário Augusto Figueiredo de Lacerda Guerreiro e Diogo Rais, além da representante do Facebook, Rebeca Garcia.
Guerreiro foi o primeiro a falar, estabelecendo um panorama geral do que seria fake news, ou seja: o conteúdo falso que é divulgado para angariar adesão (os chamados “likes”, ou curtidas), direcionado a diminuir a credibilidade de alguém ou alguma coisa, mediante a mobilização da opinião pública. Ele citou a existência das chamadas bot farms, empresas dedicadas a montar e fazer funcionar perfis falsos, em geral por meio de robôs, para a divulgação de conteúdo inverídico. Também mencionou o surgimento de agências dedicadas a identificar e combater a disseminação de notícias falsas, tanto no exterior quanto no Brasil. Por fim, ele apontou as inovações trazidas à legislação eleitoral para o combate à divulgação de notícias falsas.
Gustavo Guedes, por sua vez, lembrou o impacto das notícias falsas nas eleições norte-americanas. Segundo ele, 46% do conteúdo que circulou pelas redes sociais durante a campanha era falso e mais de 126 milhões de pessoas foram impactadas por essas notícias. Isso demonstraria que o grande desafio das eleições de 2018 serão justamente as redes sociais, em especial plataformas de mensageiros, como o WhatsApp.
Ele questionou como se dará a aplicação da legislação nos casos de notícias falsas, principalmente quando envolverem o direito de resposta contra sites de menor impacto, à margem da campanha eleitoral oficial, que tenham disseminado conteúdo ilegítimo. Também destacou que, no caso das fake news, o ônus de provar a inocência é deslocado para o acusado pela notícia falsa, ao contrário do que acontece na esfera penal, em que o ônus da prova é do acusador. Por fim, sugeriu o desenvolvimento, pelas plataformas de redes sociais, de ferramentas que auxiliem os seus departamentos jurídicos na identificação de perfis falsos, bots e guerrilha virtual.
O professor Diogo Rais, por sua vez, traçou uma distinção entre o que seria fake news e a mera desinformação, segundo os parâmetros do dolo na divulgação, a escala alcançada e o dano causado às reputações. “As pessoas estão mais preocupadas com a febre do que com a infecção”, comparou ele ao lembrar que a sua origem ou até mesmo a “verdadeira infecção”, seria a profunda polarização que caracteriza o debate político atualmente no Brasil.
Segundo ele, muito pouco pode ser feito em relação à polarização; mas a desinformação, por outro lado, que é o seu fruto mais conhecido, pode ser combatida por meio da disseminação mais assertiva de informações legítimas.
Ele defende que não é a hora de se tentar regular as fake news porque, na prática, isso seria um trabalho infrutífero. Segundo Rais, a legislação já dispõe de dispositivos para coibir a calúnia, injúria ou difamação, sendo a solução para a nossa realidade o reforço na divulgação de notícias confiáveis.
Rebeca Garcia, por sua vez, propôs a definição de fake news como sendo “a informação intencionalmente falsa, produzida para ser confundida com notícia ou informação legítima”.
Em sua opinião, as redes sociais não têm o papel de serem árbitros da verdade, sendo que o seu foco é o comportamento de seus usuários. Segundo ela, o Facebook reprime a disseminação de conteúdo falso em quatro frentes: a repressão de contas falsas; a redução na distribuição de conteúdo falso; o apoio à comunidade informada, reforçando o jornalismo e firmando parcerias com agências dedicadas ao combate às notícias falsas; e, por fim, a promoção de uma maior transparência em seus anúncios e conteúdo impulsionado.
“Não é o objetivo do Facebook ter uma atitude paternalista ou tutelar o seu usuário”, afirmou ao citar a estrutura que foi montada pela plataforma para averiguar e acompanhar denúncias de violações aos padrões da rede, que são feitas diariamente pelos seus usuários no mundo todo. Além disso, ela citou iniciativas como o estabelecimento de parcerias com agências de fact-checking e a realização de campanhas para a conscientização dos usuários sobre notícias falsas.
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(com Assessoria de Imprensa)